O antigo couto de Cadima era composto por vários lugares e quintas que entretanto despareceram, mudaram de nome ou simplesmente deixaram de ser habitados.
Um desses lugares foi a Palheira (também denominada por vezes de Palheiras). Através de uma análise cronológica e de migrações vamos apontar onde seria hoje a Palheira.
A primeira referência conhecida à Palheira (na realidade, Palheiras) aparece num batismo a 26 de Agosto de 1620: em Cadima era batizada Ana, filha de António Gonçalves e de Margarida Gomes, do Escoural, tendo sido seus padrinhos Francisco Anes o Ferreiro, de Lemede e Maria Gomes, mulher de Pedro Domingues, morador nas Palheiras.
Ainda nessa década há mais 7 referências à Palheira nos registos paroquiais de Cadima, a saber:
- 1. 16-jun-1622: o batismo de Ângela, nascida nas Palheiras, filha de Pedro Domingues e de Maria Gomes.
- 2. 8-jun-1624: o batismo de Catarina, nascida na Ribeira da Fervença, filha de Manuel Gomes o Novo e de Isabel Francisca. Foram padrinhos Pedro Domingues, morador na Palheira e Ana Jorge, mulher de António Simões, todos da Ribeira.
- 3. 5-mar-1625: o batismo de Isabel, nascida nas Palheiras, filha de Pedro Domingues e de Maria Gomes.
- 4. 19-nov-1625: o batismo de António, nascido no Barganção, filho de Manuel Domingues e de Isabel Antónia. Foram padrinhos João Simões, morador Entre As Agoas, moleiro, e Maria Gomes, mulher de Pedro Domingues, das Palheiras.
- 5. 29-jun-1627: o batismo de Pedro, nascido nas Alagoas Negras, filho de Francisco Gomes e de Catarina Antónia. Foram padrinhos Pedro Domingues, da Palheira e Luzia, solteira, filha de Manuel Gomes o Velho, morador na Fervença.
- 6. 12-set-1627: o batismo de Ana, nascida nas Palheiras, filha de Simão Jorge e de Maria Rodrigues.
- 7. 13-jan-1628: o batismo de Margarida, nascida na Palheira, filha de Pedro Domingues e de Maria Gomes.
Daqui se deduz que a Palheira já seria habitada em 1620 pela família de Pedro Domingues e sua mulher Maria Gomes. Em 1627, também Simão Jorge e Maria Rodrigues aí vivem. As famílias que habitaram a Palheira nessa primeira metade do século XVII são as seguintes:
1. Pedro Domingues e sua esposa Maria Gomes (terão casado antes de 1620). Pedro Domingues faleceu na Palheira a 5-jan-1633.a. Angela Domingues, nascida na Palheira e batizada a 16-jun-1622 em Cadima (padrinho da Fervença, madrinha do Escoural), faleceu no mesmo lugar a 6-dez-1645.
b. Isabel, nascida na Palheira e batizada a 5-mar-1625 em Cadima (padrinho do Escoural, madrinha do Escoural).
c. Margarida, nascida na Palheira e batizada a 13-jan-1628 em Cadima (padrinho do Escoural, madrinha de Cadima).
d. Manuel, nascido na Palheira e batizado a 3-abr-1630 em Cadima (padrinho dos Barrins, madrinha da Fervença).
2. Manuel Jorge Rodrigo e sua esposa Maria Francisca Gomesa. António, nascido na Palheira por volta de 1633, faleceu na Palheira a 22-mar-1645.
b. Catarina, nascida na Palheira e batizada a 19-jan-1635 em Cadima (padrinho da Taboeira, madrinha da Fervença)
c. Domingos, batizado a 5-abr-1638 em Cadima, não indica local de nascimento (padrinho da Palheira, madrinha da Palheira).
d. Pedro, nascido na Sanguinheira e batizado a 30-jan-1641 em Cadima (padrinho da Guimara, madrinha de ?).
e. Francisco, nascido na Palheira e batizado a 21-out-1643 em Cadima (padrinho da Póvoa, madrinha da Póvoa).
f. Maria
3. Simão Jorge Rapaduro e sua esposa Maria Rodrigues. Maria Rodrigues faleceu na Palheira a 27-fev-1657.a. Maria, nascida no Olho e batizada a 16-mar-1626 em Cadima (padrinhos do Escoural).
b. Ana, nascida na Palheira e batizada 12-set-1627 em Cadima (padrinho da Ribeira, madrinha da Guimara).
c. Manuel, nascido na Sanguinheira e batizado a 4-jun-1630 em Cadima (padrinho de ?, madrinha do Corgo do Encheiro).
d. Isabel, nascida na Sanguinheira e batizada a 17-jun-1632 em Cadima (padrinho da Lagoa do Grou, madrinha da Póvoa).
e. António, nascido na Sanguinheira e batizado a 28-mai-1634 em Cadima (padrinho de ?, madrinha do Escoural).
f. Angela, nascida na Sanguinheira e batizada a 6-jul-1636 em Cadima (padrinho da Póvoa, madrinha do Corgo [do Encheiro]).
g. Domingos, nascido na Sanguinheira e batizado a 4-jul-1638 em Cadima (padrinho do Corgo [do Encheiro], madrinha de Vila Franca).
4. Pedro Simões e Maria Domingues (casados antes de 1635). Maria Domingues faleceu na Palheira a 21-jan-1660. Pedro Simões faleceu na Moita a 31-dez-1679. [devem ter mudado para a Moita antes de 1674]a. Maria, nascida na Palheira e batizada a 18-jan-1635 em Cadima (padrinhos do Escoural).
b. Angela, nascida na Palheira e batizada a 21-dez-1636 em Cadima (padrinho do Braganção, madrinha do Escoural).
c. Ana, nascida na Palheira e batizada a 27-jan-1639 em Cadima (padrinho da Taboeira, madrinha dos Barrins). Faleceu a 25-dez-1679 na Moita.
d. Manuel, nascido na Palheira e batizada a 9-jan-1641 em Cadima (padrinho do Escoural, madrinha da Taboeira).
e. Pedro, nascido na Palheira e batizada a 17-fev-1643 em Cadima (madrinha da Gesteira).
f. Margarida [João], nascida na Palheira e batizada a 6-abr-1645 em Cadima (padrinho da Corujeira, madrinha da Guímara), casou com Geraldo Francisco. Feleceu a 15-out-1705 na Moita.
g. Francisco, nascido na Palheira e batizado a 12-jan-1648 em Cadima (padrinhos da Guímara).
h. Francisca [João], nascida na Palheira e foi batizada a 6-mar-1650 em Cadima (padrinho da Guímara, madrinha do Escoural), casou em 7-jul-1675 com Manuel de Oliveira, era dita da Moita. Faleceu, viúva, a 1-nov-1719, nos Carreiros.
i. João, nascido na Palheira e foi batizado a 30-jun-1652 em Cadima (padrinho de Lemede). Faleceu a 11-dez-1674 na Moita.
j. Isabel. Faleceu a 28-dez-1679 na Moita.
5. Manuel Jorge Lourenço e Maria Gomes. Maria Gomes faleceu na Palheira a 28-jan-1660.a. Catarina, solteira quando foi madrinha em 11-fev-1657.
6. 6. António Simões Pontadas e Maria Antónia.
a. Ascenso, nascido na Palheira e batizado a 28-mai-1637 em Cadima (padrinho das Quintas, madrinha das Ribeiras).
b. Maria, nascida na Palheira e batizada a 4-jul-1643 em Cadima (padrinhos da Palheira).
7. Manuel Simões e Maria Jorge.a. Isabel, nascida na Palheira e batizada a 1-set-1643 em Cadima (padrinho da Água Doce).
8. Manuel António e Maria Domingues.a. António, nascido na Palheira e batizado a 3-out-1646 em Cadima (padrinho do Escoural, madrinha da Guímara).
9. Manuel Francisco [Rodrigo] e Ana Francisca.a. Maria, nascida na Palheira e batizada a 20-mai-1656 em Cadima (padrinho da Palheira, madrinha do Escoural). Casou com Simão Fernandes, da Gesteira, em em Cadima a 24-ago-1676).
Depois de 1660 há muito poucas referências à Palheira, seria estranho todas estas famílias terem desaparecido. No entanto, do registo das famílias acima podem-se ver referências essencialmente à Sanguinheira e à Moita (para a família de Pedro Simões).
Ora, a primeira referência concreta à Sanguinheira aparece a 27-jul-1630, quando Manuel, filho de Simão Jorge e de Maria Rodrigues é batizado em Cadima. Sendo que a partir dessa data a Sanguinheira começar a ter mais referências, essencialmente associadas às famílias apresentadas acima, o que nos pode levar a deduzir que a Sanguinheira e a Palheira (ou Palheiras) eram um só lugar, e que durante 30 anos os padres acabaram por usar os dois nomes de forma aleatória.
Outra prova, mais directa e concreta ainda, aparece no ano de 1657.
A 4 de Fevereiro de 1657, na igreja de Cadima, era batizada Maria, nascida no Escoural, filha de João Domingues e de Maria Tomé. O vigário foi o seu padrinho, a madrinha foi Catarina, provavelmente solteira, filha de Manuel Jorge Lourenço, das Palheiras (ver família deste Lourenço acima). Exactamente uma semana depois (11 de Fevereiro de 1657) era a vez de Domingos ser batizado na mesma igreja. Domingos nascera na Sanguinheira, e era filho de Domingos Jorge e de sua mulher (não especificada no registo). O padrinho foi Manuel Francisco e a madrinha, mais uma vez, Catarina, filha de Manuel Jorge Lourenço, dali. Ora, quando se especifica dali, o padre refere-se à Sanguinheira, enquanto que no registo da semana anterior, especificou a Palheira, portanto, o mesmo lugar.
Este último batizado, era filho de Domingos Jorge e de Brites Francisca, e este Domingos Jorge (o pai) era por sua vez, filho de Manuel Jorge Rodrigo e de sua mulher Maria Francisca que também viveram na Palheira/Sanguinheira (o terceiro filho deles conforme a lista de famílias da Palheira detalhada acima).
Sendo assim, podem-se deduzir os seguintes factos:
- Pedro Domingues e Maria Gomes foram os primeiros habitantes da Palheira (conhecidos), tendo-se instalado aí antes de 1620.
- Simão Jorge [Rapaduro] e Maria Rodrigues, que vieram do Olho e se instalaram na Palheira, foram os primeiros a registar uma criança nascida na Sanguinheira já com este nome.
- A família de Pedro Simões e Maria Domingues que viveu na Palheira pelo menos durante 25 anos (de 1635 a 1660) mudou-se para a Moita (meso ali ao lado) após a morte de Maria Domingues e antes de 1674.
- A Palheira (ou Palheiras) foi, sem grandes dúvidas, o nome do lugar que depois se passou a designar de Sanguinheira (até hoje), tendo “coabitado” as duas designações durante alguns anos até cerca de 1660.
Referências:
[1] Registos Paroquiais de Cadima (https://pesquisa.auc.uc.pt/details?id=36141).
[2] Base de Dados de Nuno Silva.