domingo, 27 de outubro de 2019

Baú da Gesteira: João "da Velha" - um homem da nossa terra


Estávamos nas Taipinas no longínquo ano de 1901, no dia 10 de abril nascia João, filho legítimo de João Gonçalves Sebastião e de sua mulher Maria dos Santos. João foi batizado pouco tempo depois, a 26 de maio do mesmo ano, na igreja de Cadima.

Segue a árvore genealógica de João Gonçalves Sebastião. É de notar que João era descendente por linha paterna directa do primeiro “Sebastião” de sobrenome da freguesia de Cadima (hoje Sanguinheira). Na verdade o trisavô do João da Velha, António Gonçalves, era filho de Sebastião Francisco e de Bárbara Maria, da Gesteira, e este Sebastião Francisco foi o que deu sobrenome a todos os “Sebastiões” que ainda hoje existem, quer na freguesia da Sanguinheira, quer fora dela, incluindo no Brasil.


João Gonçalves Sebastião foi o terceiro filho de pelo menos oito que os seus pais tiveram. Dois desses filhos emigraram para o Brasil, Manuel Gonçalves Sebastião e Hermínia dos Santos. Primeiro viveram na Rua Rodrigues Alves, 862, em Ribeirão Preto, estado de São Paulo, e mais tarde na Rua Caminho do Engenho, 249. Os restantes irmãos de João foram: Maria dos Santos, Maria da Luz dos Santos (faleceu criança), Luísa dos Santos, Maria da Luz dos Santos, e Deolinda dos Santos.
João Gonçalves Sebastião casaria no dia 1 de janeiro de 1923, no Posto do Registo Civil de Cadima, com Ana Gomes, de 49 anos, viúva de Manuel Gomes Neto, que faleceu de lepra na Gesteira a 12 de julho de 1912. Deste primeiro casamento Ana teve descendência, uma filha de nome Maria Gomes, casada com Manuel Teixeira Nogueira em 1909 (ela tinha 14 anos e ele 25), tinha 17 anos quando o pai faleceu, era proprietária e residente no Olho.
Ana Gomes era filha de Francisco Gomes Marto e de Isabel Gomes, todos da Gesteira.

Segue a árvore genealógica simplificada de Ana Gomes.


Ana Gomes tinha também vários irmãos, nomeadamente a Conceição Gomes, a Isabel Gomes e o Manuel Gomes Marto, todos naturais da Gesteira.

Ora, João Gonçalves Sebastião, um jovem de 21 anos casou com uma prima afastada de 49 anos, e por isso, veio mais tarde a adquirir a alcunha de João “da Velha”. Porque teria João casado com Ana? Seria por amor ou por interesse?

O que se sabe é que não tiveram filhos, e o João “da Velha” ficaria viúvo 30 anos depois de casar, a 23 de julho de 1953. Ainda viveu mais 20 anos, sendo conhecido de muita gente ainda hoje, tendo deixado a sua herança aos sobrinhos. João Gonçalves Sebastião faleceu a 27 de junho de 1974.

Pode-se também identificar pelas duas árvores acima que João Gonçalves Sebastião e Ana Gomes eram parentes em terceiro e quarto grau, quer pelo casal Alexandre da Cruz e Mariana dos Santos, da Guímera, quer pelo casal Manuel Rodrigues Padelho e Florência Maria, da Gesteira.

Fontes:
Registos Paroquiais de Cadima - Arquivo da Universidade de Coimbra.
"Brasil, Cartões de Imigração, 1900-1965," FamilySearch (https://familysearch.org/ark:/61903/3:1:33S7-95YT-VV3?cc=1932363&wc=QS6J-92C%3A1019548401%2C1019835101 : 5 June 2019), Group 8 > 004914012 > image 150 of 203; Arquivo Nacional, Rio de Janeiro.

segunda-feira, 21 de outubro de 2019

Baú da Gesteira: O primeiro enterro no Cemitério Público de Cadima

Há vários séculos que a igreja era o local oficial tradicional das inumações, seja no seu interior seja nos átrios à sua volta (adro). Destinavam-se estas sepulturas aos cristãos, de preferência os que pudessem pagar e não fossem mal vistos pela hierarquia eclesiástica, e esses eram sepultados dentro da igreja, os pobres e restantes eram sepultados no adro.

Mas o espaço das igrejas era também o prinicpal ponto de encontro da comunidade, um local de circulação, até haveria feiras de gado perto, batizados, casamentos, procissões e festas que se desenrolavam por cima dos cadáveres...

A instauração de cemitérios civis como um serviço público - foi decretada em Lisboa em 1835 - não seguiu em Portugal grandes debates ou planificações, como noutros países da Europa, o objectivo era responder a emergências, nomeadamente como uma resposta a uma epidemia de cólera morbus que assolou Portugal por volta de 1833. Aproveitou-se então para retirar o local de sepultamento do local de culto e onde o povo passava algum tempo, estando portanto exposto a maus cheios e condições de insalubridade extrêmas.

Mas em Cadima, o cemitério público não começou a ser usado efectivamente que a partir de 18 de janeiro de 1893! No entanto, uma notícia do Campeão das Províncias de 22 de novembro de 1893 salienta a importância de vedar o adro da igreja por causa dos animais que lá vão pastar e indica que só desde há 8 meses se deixaram de sepultar os mortos lá, afinal já há 10 meses que isso não se fazia.

Isabel Dourada, do Olho, faleceu ali a 6 de janeiro de 1893 e terá sido sepultada, como era hábito, no dia seguinte, no adro da Igreja de Cadima. Foi o último corpo a ser sepultado no adro da igreja de Cadima, a partir dessa data todos os defuntos iriam para o cemitério de Cadima, no locla que hoje conhecemos.

Quando a 18 de janeiro de 1893, Ana de Jesus, da Taboeira, foi sepultada, esta já o foi no Cemitério Público de Cadima. Ana de Jesus tinha 30 anos, era solteira e filha de Francisco António e de Júlia de Jesus, das Nogueiras, faleceu na Taboeira a 17 de janeiro de 1893, deixou duas filhas e não fez testamento.

No entanto, sabe-se que o Cemitério Público de Cadima já existia, e talvez pelo medo da mudança e a força da cultura e da crença de que os mortos sempre se enterrariam na igreja ou junto a esta, poucos foram os cadáveres que aí se sepultaram, continuando a usar-se a igreja. O primeiro sepultamento conhecido no Cemitério de Cadima terá sido a 8 de abril de 1887 (quase 6 anos antes de se tornar comum). Nesse dia ter´sido sepultado Joaquim, criança de 3 meses, filho de Joaquima Gomes dos Santos e de Maria Luísa, da Gesteira. Este meu tio-bisavô foi o primeiro a ser sepultado no Cemitério Público de Cadima!

Assento de Óbito de Joaquim em 1887.


Fontes:
Registos Paroquiais de Cadima - Arquivo da Universidade de Coimbra, Óbitos de 1893 e 1887.
Campeão das Províncias de 22 de novembro de 1893 - Arquivo da Universidade de Coimbra.